A "Parábola da Mesa de Doces": Como brigadeiros explicam radares e regras de trânsito!

25-12-2025

Introdução: O Desconforto da Multa

Sabe, toda vez que a gente toca no assunto 'radar' ou 'fiscalização de trânsito', o clima esquenta. É natural. Ninguém gosta de receber aquela carta em casa, ver os pontos na carteira e ter que pagar uma conta que não estava no planejamento.

E aí, quase que automaticamente, surge aquela frase que a gente ouve em todo churrasco, em toda conversa de bar: 'Isso é tudo uma indústria da multa. Só querem arrecadar'.

Eu entendo esse sentimento. De verdade. Mas, hoje, eu queria te convidar a olhar para isso de um jeito diferente. Vamos sair um pouco do asfalto, do carro, do estresse do trânsito... e vamos imaginar uma festa infantil.

É isso mesmo. Eu quero que você imagine uma festa de aniversário de crianças de 5 ou 6 anos. Porque, acredite ou não, o comportamento daquelas crianças explica exatamente por que nós temos radares nas ruas.

O Cenário: A Mesa de Doces

Imagina o cenário: um salão de festas. No centro, tem aquela mesa maravilhosa. O bolo, os brigadeiros, os beijinhos, os brinquedos da decoração. Aquela mesa é o objetivo. No nosso mundo real, a mesa representa a via pública, a fluidez, a vantagem de chegar mais rápido.

Em volta dessa mesa, estão os adultos (os pais). Eles representam o Estado, a fiscalização. A regra que eles passaram é clara: 'Ninguém toca na mesa até a hora do parabéns'. Essa é a lei. É o limite de velocidade. É para garantir que, na hora certa, todo mundo tenha bolo e a festa seja boa para todos.

Só que as crianças... bom, elas têm vontade. A vontade de pegar o doce antes da hora é instintiva, assim como a nossa vontade de acelerar um pouquinho mais quando a estrada está vazia.

E é aqui que a mágica acontece. Se a gente observar bem, vamos ver que as crianças nessa festa se dividem em três grupos muito claros.

O Primeiro Grupo e o Terceiro Grupo (Os Extremos)

Primeiro, temos o Grupo dos Comportados. São aquelas crianças mais calmas, que entenderam a regra. Elas olham para o doce, sentem vontade, mas lembram que o pai disse 'não'. Elas têm um controle interno. Mesmo se os adultos saírem da sala para pegar um refrigerante, essas crianças vão continuar brincando longe da mesa. No trânsito, esse é aquele motorista que, mesmo de madrugada, sem nenhum carro na rua, respeita o sinal vermelho e o limite de velocidade. Ele não precisa de radar para fazer o certo. Mas, sendo realista... esse grupo não é a maioria.

Agora, vamos pular lá para o outro extremo. O Terceiro Grupo. Vamos chamar de... 'A Turma do Barulho'. São aquelas crianças que são a dor de cabeça dos pais. Elas são avessas a ordens. Elas testam o limite o tempo todo. Elas ficam rondando a mesa, esperando uma brecha. Se o adulto piscar, elas roubam um brigadeiro. Se o adulto sair da sala, elas sobem na mesa e derrubam o bolo.

E aqui tem um detalhe curioso sobre esse terceiro grupo: a reação à bronca. Quando o pai pega essa criança com a boca suja de chocolate e coloca de castigo, o que ela faz? Ela pede desculpas? Dificilmente. Ela se joga no chão. Ela grita. Ela faz birra. Ela diz que o pai é chato, que 'tá todo mundo pegando', que é perseguição. No trânsito, esse é o infrator contumaz. É o cara que coleciona multas. E quando chega a notificação, ele grita que existe uma 'indústria da multa'. A 'indústria da multa', nesse caso, é a birra do adulto que não aceita ser contrariado."

O Segundo Grupo: O Fiel da Balança (O Ponto Crítico)

Até aqui, tudo bem. Temos os anjinhos e os pestinhas. Mas o grande problema... o grande X da questão... está no Segundo Grupo. Esse é o grupo do meio. São as crianças influenciáveis. E, estatisticamente, elas são a grande massa da festa.

Essas crianças não são vândalas por natureza, mas também não são santas. Elas estão observando. O comportamento delas depende quase 100% do ambiente.

E aqui entra a questão do controle parental. Imagina que os adultos (o Estado) resolvam sair da sala. 'Ah, vamos deixar as crianças livres'. O radar foi desligado. A blitz acabou. O que acontece? O terceiro grupo, os bagunceiros, ataca a mesa imediatamente. O segundo grupo, as crianças influenciáveis, olha aquilo. Elas veem o Joãozinho comendo brigadeiro e ninguém brigando com ele. Elas pensam: 'Poxa, eu estou aqui me segurando à toa? Se ele pode, eu também posso'.

É o efeito contágio. A sensação de impunidade do grupo rebelde contamina o grupo do meio. Em cinco minutos, a festa virou um caos, a mesa foi destruída e não sobrou bolo pra ninguém. O trânsito virou uma selva.

A Conclusão: Por que o "Pai" precisa estar na sala?

Então, quando a gente volta para a realidade das ruas, a lógica é a mesma. O controle, a fiscalização, o radar... eles não estão lá apenas para punir o infrator contumaz (aquele que faz birra). Eles estão lá para segurar a onda do grupo do meio.

A presença do radar garante para o motorista comum que vale a pena seguir a regra. Quando o 'adulto' está na sala vigiando a mesa, o grupo do meio se comporta igual ao primeiro grupo. Eles se mantêm na linha. E o grupo dos bagunceiros? Bom, eles são forçados a se controlar, senão vão para o castigo.

O controle estatal nas vias públicas é exatamente esse controle parental na festa. A vontade de 'atacar a mesa' (de correr mais, de furar a fila, de levar vantagem) existe em quase todos nós. O que nos difere é como reagimos quando achamos que ninguém está olhando.

Encerramento

Então, da próxima vez que você passar por um radar ou ver uma fiscalização, tenta não pensar na 'indústria da multa' ou na arrecadação. Lembra da festa. Lembra que aquele equipamento é o adulto na sala, garantindo que a mesa de doces continue inteira para a hora do parabéns. Garantindo que a 'turma do fundão' não estrague a festa da maioria. Porque, no fundo, a gente só quer chegar em casa bem e com o bolo inteiro, não é?

Marcelo Dullius Saturnino
Especialista em Segurança Viária
Autor